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JORNAL O TEMPO DE 24 DE NOVEMBRO DE 2013
Edifício histórico no centro de BH retorna ao roteiro de jovens após a abertura de bares e restaurantes na sacada do 2º andar
PUBLICADO EM 24/11/13 - 04h00
Na sala 17 do edifício Maletta, onde funciona a administração do
complexo, um senhor entra para perguntar sobre salas disponíveis para
venda. Depois de uma breve conversa com a recepcionista, ele sai
cabisbaixo. O homem descobriu que dentre as 642 salas do condomínio,
apenas uma está a venda.
Esse acontecimento reflete com precisão a lei da oferta e da procura.
Nos últimos três anos, o interesse das pessoas pelo Maletta cresceu, e o
prédio voltou a entrar no cenário cultural e noturno da cidade devido à
abertura de bares e restaurantes na sobreloja. A variada opção de
estabelecimentos causou, desde então, uma agitação entre os jovens que
tornaram a sacada do segundo andar do prédio um dos locais mais
disputados para conseguir uma mesa nas noites do fim de semana em Belo
Horizonte.
Segundo o atual síndico do prédio Amauri Reis, essa redescoberta do
local é explicada por vários fatores. “Estamos em um local
geograficamente privilegiado que faz parte da história da cidade e que,
atualmente, conta com um complexo gastronômico em um ambiente seguro e
ventilado”, conta.
A descrição feita pelo síndico tende a agradar a um público diverso e
assim o faz. Na sacada da sobreloja, onde estão localizados a maioria
dos novos bares, avista-se de longe todas as mesas ocupadas, cena que
remete à tradicional áurea boêmia do local. “Noto que o Maletta é
frequentado por jovens com mais de 25 anos, em sua maioria. É o pessoal
que cansa da pracinha e vem sentar em um café,” brinca o advogado
Jeferson Baêta, freguês dos bares e residente do edifício há três anos,
que salienta também a heterogeneidade do ambiente. “O mais interessante é
que, apesar da maioria dos frequentadores ser jovem, vejo diariamente
diversas tribos convivendo pacificamente aqui. São famílias, gays, o
pessoal rastafári”.
Quem comprova que o movimento cresceu nos últimos meses é o
proprietário da Cantina do Lucas, o tradicional restaurante tombado como
patrimônio da cidade, Edmar Roque. “Conseguimos notar um maior
movimento nos últimos tempos. Apesar de sempre termos tido um bom
público, houve uma época que fiquei receoso, mas hoje não mais. Os bares
na sobreloja são super interessantes e ajudam muito a atrair um público
cult que dá mais densidade ao espaço”, reflete o administrador, que
está à frente do Lucas – como é chamado o restaurante pelos clientes
habituês – há 31 anos.
Comparação. Um dos
frequentadores mais assíduos do local é o professor Marcelo Dolabela.
Desde 1974, ele participa de manifestações culturais, como recitais de
poesias e produção de fanzines no local e, além disso, já morou lá duas
vezes. Para o professor, a diferença é notável. “O público que
frequentava o Maletta entre os anos 1974 e 1986 era bem diferente. Um
dos motivos é que o centro era mais agitado por sediar bancos, redações
de jornais, a imprensa oficial e faculdades também. Além disso, a
maioria dos teatros e casas de shows estava no entorno do prédio. Isso
fez com que o Maletta fosse sede de encontros entre estudantes da
esquerda, intelectuais e jornalistas. Depois dos anos 90, os jovens
tornam-se predominantes”, analisa.
Para ele, essa ressurgimento dos bares e do público é importante para
manter a diversidade. “Essa nova turma traz um novo ritmo para o
Maletta. De uns tempos para cá, as manifestações artísticas voltaram a
povoar os corredores, não é raro ver um banda tocando por aqui ou uma
intervenção sendo feita. Com certeza, o Maletta estava precisando dessa
juventude para manter sua vitalidade”, diz Marcelo.
Apesar de a renovação de pessoas ser importante para manutenção do
edifício, Marcelo salienta que a tradição não deve ser esquecida, pois
faz parte da construção simbólica do lugar. “É legal ter bares
diferentes que atraiam pessoas também diferentes, mas isso pode ser
moda. E moda passa. Por isso, acredito que seja ideal manter um
equilíbrio entre moda e tradição. Há restaurantes antigos aqui, como a
Cantina do Lucas, e os sebos, que sediam relações subterrâneas de alguns
frequentadores. Por exemplo, pouca gente sabe que Ruy Castro e Charles
Gavin, sempre que vêm a Belo Horizonte, visitam o sebo do Tião (o Vila
Rica)”, revela.
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